aquele silêncio que precede a queima dos fogos de artifício reinava. eu lavava o rosto imaginando as pessoas em suas casas, preparando tudo para aqueles 10 segundos. existe uma tensão nesses minutos, uma mudança de energia. escolho um pijama bonito, de linho, recém lavado e com cheiro de que secou ao sol. coloco um robe já com a máscara de dormir na testa, e sento na sacada para esperar a meia noite, são 23:58.
acho que finalmente entendo que o ano acabou. queria fazer um chá para brindar o fim desse ciclo, mas perderia o grande momento. quantas coisas eu perco pensando em como vivê-las da melhor maneira possível, a invés de só vivê-las? estou cansada de aprimorar, de adaptar, de transformar.
identifico uma pontinha de desejo (meu novo objeto de estudo) com alegria: quero um pouco de estabilidade — isso é tão inédito em mim! pego essa vontade recém nascida no colo e começo a vislumbrar uma imagem embaçada e netuniana. algo novo está por vir. o barulho dos fogos interrompe meu devaneio e eu sorrio por virar o ano com uma intenção no coração. "é quase como colocar 7 folhas de louro na carteira", penso.
assisto às luzes no horizonte e comemoro internamente o final de 2023. com gratidão, mas com alívio, acolhendo a incerteza de 2024 cheia de expectativas positivas.
passei dezembro exausta, chateada e atrasada em diversos projetos. dessa vez não era somente minha mente me convencendo de que eu podia trabalhar mais, treinar mais, reagir mais. eu PRECISAVA fazer mais de fato, e não pude. fazer o quê? eu tinha consciência de que estava dando tudo de mim — tudo dentro do meu novo normal pós burnout — e estava em paz com o caos.
mas o caos reinou mesmo e, em meio as gravações, consultorias financeiras e lançamentos, eu estava processando o final inevitável de uma relação (ou da ilusão dela) e toda uma nova percepção do que significa escolher uma pessoa. com meu coração apertado, meu corpo em velocidade reduzida e minha cabeça nas nuvens, cheguei ao dia 29, 30, 31... sem nem perceber. mas essa é a própria magia do réveillon: olhando os fogos sozinha, sem chá nem intenções de ano novo, eu me senti forte novamente.
não tive tempo para fazer um mega balanço de final de ano, nem setar intenções. e acredito que isso tenha me ajudado a internalizar a ideia de que esse ano pode ser de fato diferente, inclusive a respeito de como lido com minhas metas e projetos. sinto minha visão de produtividade chegando a mais um ponto de virada.
é o que dizem: se você quer uma vida diferente, faça diferente. muitas vezes eu li essa frase como “faça melhor” "faça mais". mas e se o sentido for literalmente “faça outra coisa mesmo que ela não tenha muito sentido"?
no geral, antes mesmo do ano acabar, tenho bem definidas as metas para os próximos 12 meses (e dos 7, 5, 2 anos a frente). sou naturalmente movida a resultados e também tenho uma forte tendência a começar no modo “hard”. me planejo de trás para frente, sempre com o futuro em mente. e muitas vezes, quando o que estou fazendo hoje não tem uma conexão clara e direta com algo que desejo a longo prazo, me desinteresso.
mas esse ano me parece já ter começado essencialmente diferente. em uma perspectiva pessoal, eu consigo sentir no campo algo de “incomum”, como se não adiantasse muito agir como antes eu agiria. é como se tivesse uma neblina no caminho, e ao invés de enxergar tudo com clareza, eu precisasse ir pé ante pé. cada pedacinho do caminho se revelando diante de mim. não sei, não tenho como afirmar como as coisas serão, mas posso sentir o cheiro da mudança e meu palpite é que o que muda é de dentro para fora.
quando reflito sobre os últimos anos — principalmente os pandêmicos — sempre precisei ajustar meus planos ao longo dos meses. sempre me preocupo em criar projetos adaptáveis, e esse “plano anual” funcionava mais como uma forma de me sentir entrando em uma nova fase, do que de fato algo que eu acabava seguindo. é um ato ritualístico importante, mais do que um guia.
eu sei meus valores na vida, tenho um mapa do que é inegociável para mim, tenho minha ética de trabalho e conheço minhas necessidades emocionais básicas. já entendi que estou em um longa fase de aprendizado sobre relações e em uma jornada com meu corpo e minha saúde. esses pontos foram o suficiente para iniciar 2024 com a sensação de ter um norte, mesmo na falta de um grande planejamento.
sendo honesta, meu único desejo para 2024 é escutar os meus desejos. um meta-desejo de acolher e assumir o que me chama. caminhei muito para chegar nesse ponto onde posso considerar viver uma vida PARA MIM e não apenas A SERVIÇO de algo. mas essa é uma mudança de paradigma equivalente à fragmentação da pangeia para algumas mulheres, assim como para mim, então escolhi ir com cautela.
viver uma vida autêntica (ser feliz) pede espaço mental, escuta interna, silêncio, coragem. mas não podemos ser radicais aqui e colocar nossa vida prática em risco. eu ainda tenho contas a pagar, insônia, uma empresa com colaboradoras, 1000 alunas dentro da comunidade, uma audiência, além dessa newsletter (que atualmente é meu trabalho preferido). por isso sei que não posso — e nem tenho essa ansia adolescente — jogar tudo para o alto. acho que é a diferença do retorno de Saturno que acabei de encerrar.
amar os processos tanto quanto os resultados
no meio do ano passado, dei de cara com um livro feio e cinza diferente dos que geralmente me interessam.
"O Ano de 12 Semanas" de Brian P Moran foi lançado em 2013, foi best seller pelo New York Times e eu entendo porquê. apesar de nada genial, ele explora consistentemente um conceito muito simples: colocar toda sua energia em um período de 12 semanas, ao invés de 12 meses.
e se, ao invés de pensar nesses 12 meses, focássemos em fazer o melhor possível nos próximos 3? e depois desses 90 dias — fatalmente em um patamar diferente, em outra situação e tendo aprendido com o processo — fizéssemos um novo planejamento? e se eu já incluísse o recálculo de rota como uma certeza no planejamento?
como seria viver um ano mais leve, não como um bloco gigante e pesado de "muita coisa para fazer"? eu sei que as responsabilidades e vontades continuam todas lá, e distribuí-las no espaço de um ano pode parecer mais cômodo. mas quando comparamos o planejamento com a forma como de fato fazemos as coisas, podemos aprender que um prazo curto com energia concentrada é muito mais produtivo que um longo e disperso bloco de 52 semanas.
esse conceito conversa comigo logo de cara porque amo me planejar de acordo com as estações do ano (um período específico, mas que também tem 3 meses). percebo diferenças nítidas no meu corpo ao longo do tempo e me encanta a ideia de aproveitar as energias diferentes ao invés de querer um eterno verão como eu fazia nos meus 20.
depois, faz sentido se pensarmos na máxima que diz que "o trabalho se expande de modo a preencher o tempo disponível para sua realização". é sério. me dê uma semana, eu construo uma empresa. me dê um ano, eu construo essa empresa na última semana. ou pior, eu construo 52 empresas.
gostei da perspectiva, coloquei em teste essa forma de planejamento no final de 2023 e posso dizer que apesar do caos, encerrei esse ano bem. me concentrei no que gera mais impacto (minha sanidade mental mínima, lançamento de um produto para empreendedoras, reorganizar a empresa — nessa ordem), e acompanhei semanalmente o desempenho desses projetos. sei que me desgastaria muito mais se estivesse, além de tudo, pensando nos 12 meses de 2024.
essa ideia das 12 semanas nos dá uma forma prática de viver esse valor que tanto prego: o prazer no processo.
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