meu copo de café para viagem continha matchá com leite de aveia (que nem posso tomar). a luz da manhã se espalhava, e vibe parecia limpa depois de uma noite de chuva pesada. quase como se a tempestade tivesse lavado as calçadas e as nóias de todos os paulistanos enquanto dormiam.
o cheiro da terra molhada sempre lembra a caipira que sou no coração, mas algo em carregar um blazer no antebraço enquanto a mão segura um como de café, algo em usar óculos escuros, algo em esperar o sinal ficar verde, algo nisso tudo me faz lembrar a vida que eu sonhava em viver em São Paulo. a vida na cidade grande. afinal de contas, cada um tem a NYC que merece, e a minha chama SP.
faço uma selfie bem millenial, tomo cuidado de enquadrar as calçadas com o logo do estado.
atravesso a rua com uma corridinha, não estou de salto, mas me sinto um pouquinho como a Carrie Bradshaw. me sinto alegre. me sinto de volta.
de volta de onde? de volta de uma grande onda, de um tsunami, de uma inimaginável e quase interminável fase bad.
eu me senti viva atravessando aquela rua. e foi assim que entendi que não me sentia viva há tempos. eu senti o pensamento me atravessar "essa é minha vida". de uma forma prática, essa é minha vida. o bairro por onde ando dando bom dia para as pessoas de sempre. e o trânsito. as chuvas e o pôr do sol da minha sacada. atravessar aquela rua toda semana a caminho do consultório da minha analista. tomar um descafeinado superfaturado em um estabelecimento que muitas pessoas sonham em frequentar (vendo storys paulistanos) e que, para mim, é mais um lugar onde tenho "uns amigos da garçonagem" trabalhando.
minha vida, com todos os seus problemas de hoje, ainda é a vida que eu queria viver quando pisei pela primeira vez na estação Barra Funda. mas eu ainda não tinha parado para apreciar isso.
primeiro porque muito do meu crescimento profissional aconteceu durante a pandemia, e esse foi o crescimento que me permite morar em um lugar que escolhi pela segurança e beleza, que me possibilita pagar a análise e tudo que invisto em auto cuidado (incluindo o café caro e o uber de volta para casa). entendi que pelos últimos anos eu não pude desfrutar de modo real o que conquistei como rotina, como dia-a-dia. eu viajei, comprei coisas, recebi placas em comemoração das metas batidas. mas não podia aproveitar a tranquilidade de um dia-a-dia como eu gosto de viver.
depois, entendi o quanto crescer profissionalmente em um momento tão difícil para tantas pessoas fez com que eu me sentisse culpada. quase como se eu não tivesse autorização para me alegrar e para ir além da alegria. para realmente transbordar com tudo o que estava acontecendo na minha vida.
eu estava feliz e me sentia grata, mas se eu contasse tudo o que aconteceria para a Ananda de 18 anos, ela estaria soltando fogos de artifício, não apenas sorrindo de canto, entende?
Disse Nietzsche, em seu Zaratustra1: “Desde que vos tornastes novamente alegres! Em verdade, todos vós desabrochastes: parece-me que flores como vós necessitam de novas festas” (p. 300). O processo ativo de tornar-se dono de si mesmo, de conhecer a si mesmo, de aprender na luta e na conquista é o que justifica o próprio processo de instituição da alegria.
Procuramos aliados, para novas festas, novas lutas, e a instituição de novos valores! As forças que nos constituem querem isso e nada mais. Esta alegria é a força vital afirmando-se em sua plena capacidade. Ela é este processo de afirmação que multiplica o mundo e a nós mesmos. Sendo assim, podemos concluir: toda alegria quer e institui ativamente a eternidade.
A alegria é a única afecção passiva que aumenta nossa potência de agir; e só a alegria pode ser uma afecção ativa. Reconhecemos o escravo por suas paixões tristes, e o homem livre por suas alegrias, passivas e ativas. O sentido da alegria aparece como sendo o sentido propriamente ético
Deleuze, Espinosa e o Problema da Expressão, p. 1882
o que aconteceu comigo naquela faixa de pedestre, foi a potência da alegria. essa alegria que não é um fim nem um subproduto de algo, mas um meio. nada precisou acontecer naqueles minutos PARA QUE eu me sentisse de novo viva, potente, alegre. AQUILO me aconteceu, para que eu me sentisse de novo encarnada no meu corpo e na minha vida, e pudesse continuar o meu caminho.
"ficar bem, para fazer o bem" — porque triste eu não consigo te ajudar, eu não tenho potência para entregar nada ao mundo.
desidentificando da bad vibe
desde esse pequeno Nirvana, eu venho percebendo o meu papel ativo em produzir alegria dentro de mim. em fazer magia com o meu estado. ser bruxa é exatamente isso: manipular energia. saber do próprio direito de fazer o que quiser com a energia disponível (lidando com as consequências das suas intenções, claro) e buscando elementos no mundo para ampliar essa capacidade. o poder de escolher ferramentas que tornam ainda mais poderosa nossa capacidade de mudar as energias dentro e fora de nós.
coisas que tenho feito para uma manutenção da minha energia:
estou em uma dieta de sad girl songs. as vezes eu saio da dieta, tenho recaídas. mas meu limite é trabalhar ouvindo lo-fi ou um Raga (um tipo de música instrumental que leva para a concentração). fora isso, se você me ver de fone de ouvido, estou escutando Bad Bunny, Dua Lipa, Summer Eletro Hits. sim, estou com saudade da Florence Welsh, mas precisamos de um tempo.
comecei a me alimentar de um jeito um pouco mais leve, comer um pouco menos e passei por uma nutricionista nova (conto mais sobre esse processo mais para frente). basicamente estou focada em diminuir a inflamação, e cuidar da digestão/intestino/eliminação de toxinas. não como um detox, mas como um estilo de vida. a relação entre saúde mental e o intestino é enorme e eu quero ser feliz e bem nutrida.
estou me comprometendo com mais exercícios, estou testando minha capacidade. continuo treinando fofo3, mas mais dias na semana, me desafiando um tanto mais. e realmente tem uma magia que acontece no corpo em movimento.
me arrumo todos os dias pela manhã. eu sou a primeira pessoa impactada pela minha aparência, e quando me olho no espelho, quero ver uma amiga. quero ver aquela amiga que te põe para cima, que te dá vontade de fazer coisas.
nessa mesma ideia, estou buscando mais cores no meu dia. sejam objetos na minha decoração, cores no meu wallpaper, luzes coloridas, batom vermelho. por mais sóbrio que meu estilo tenha sido até então, eu já estudei muito sobre o efeito das cores e quero ser impactada por um ambiente menos "escandinavo/minimalista" e mais afetivo e caloroso. assim como quero ver mais esse lado em mim.
estou buscando estar em contato com pessoas que fazem coisas. que querem e dão passos. que vão com medo mesmo. que estão mais focadas no que está adiante. infelizmente isso significa diminuir a interação com pessoas que amo muito. mas eu não serei uma boa companhia para elas, ou para mim depois de estar com elas.
isso também significa que preciso ser mais seletiva com as clientes que mentoro individualmente. é claro que, se uma pessoa busca ajuda, ela está com um problema. mas estou usando minha sensibilidade para sentir o quanto essa pessoa está comprometida com "o mais", com a vida, com resolver tais problemas. se eu sentir que servirei de mais uma tentativa onde ela vai se sabotar, que estou sendo vista como um "bote salva vidas", que essa pessoa vai furar no segundo em que entrar, estou recomendando outros profissionais, com trabalho mais terapêutico e mais preparados para acolher essa demanda. hoje eu não estou.
estou praticando mais a meditação e o rezo das chakras4. o rezo dos chakras nasceu em um momento onde eu estava MUITO mal emocionalmente. eu fazia esse rezo no ônibus ou na reunião que tínhamos diariamente antes de começar o trabalho (enquanto minha gerente falava, eu imaginava cores, visualizava coisas, conversava com meu corpo). o rezo foi um bálsamo naquela época, e estou aplicando agora. estou bem enferrujada na prática da meditação (aquela simples meditação budista), mas vou perseverar.
e deste último minuto: enquanto escrevia esse texto para você, decidi deletar o Instagram do meu celular, deixando o app no Ipad. mesmo colocando um limite de 15 minutos no Iphone, acabei criando o ritmo de abrir muito brevemente. é engraçado e quero refletir e estudar mais sobre isso, mas o hábito com essa rede meio que "se molda" às minhas estratégias/tentativas de usa-la menos. não é novidade, já existem muitos estudos sobre como o Instagram afeta o emocional das pessoas, mas eu ainda associava a como a pessoa usa. aparentemente é mais sobre como a plataforma foi criada, para quais propósitos. hoje ela é uma coisa que abro automaticamente de tempos em tempos, e que definitivamente não me faz mais feliz. então por hora o app fica no ipad para quando eu precisar postar stories, responder caixinhas e subir conteúdos.
em resumo: estou colocando de lado por hora, ou me livrando completamente, de tudo o que me dá a sensação de peso/lentidão, que reforça minha culpa por ser feliz, que romantiza a falta de saúde mental, ou que me deixa entediada. de difícil já basta a vida como ela é.
PS: eu sei que a tristeza, a insegurança ou as situações frustrantes sempre vão acontecer. eu só não quero ficar parada nelas. eu não quero que as emoções difíceis de lidar ditem como eu enxergo a vida, porque eu sei que a vida é boa. e minha crença em quão boa a vida é foi o que me levou a criar uma boa vida para mim. me esconder, conter minha alegria, me manter onde estou… nada disso salva o mundo, nada disso muda nada de difícil que acontece por aí. meu cuidado tem sido sentir (e não mais ignorar) as emoções mais densas, nomear ("ah, isso que estou sentindo é medo" "hm, acho que fiquei intimidada") e em seguida, liberar. realmente mudar minha narrativa sobre os fatos que estão me levando a essas emoções. tipo “tchau, emoção, obrigada pela visita”. mas esse é um papo para outra newsletter.
pequeno ato mágico.
uma microbruxaria que você pode colocar em prática no seu cotidiano.
para aguçar a intuição. saia para caminhar em um lugar que não passa com tanta frequência. escolha um lugar seguro, e vista roupas confortáveis, por favor. a cada esquina, se imagine seguindo reto, ou dobrando a esquina. imagine os dois cenários, e perceba qual deles você "vê" mais nitidamente. pode ser uma diferença mínima, ou muito óbvia (pode ser que você nem consiga se imaginar pegando um dos dois caminhos). seja qual for a direção que você consegue se imaginar mais nitidamente, tome esse caminho. faça isso com cada curva, cada etapa. a intuição gosta de quando seguimos o que ela aponta. este treino vai fazer sua intuição gostar cada vez mais de você, e quem sabe o que você pode encontrar nesse processo... preste atenção no que vê, no que escuta, no que sente.
recados
estamos vivendo uma temporada mais densa aqui no Sendo Amadora, onde vou enviar mais de uma edição por semana. fique atenta 🖤
do dia 25 de março ao dia 1 de maio eu darei 18 aulas sobre organização para empreendedoras e autônomas gratuitamente. clique aqui para conhecer o Desafio Autônoma & Organizada.
se eu pudesse definir o Sendo Amadora em um termo, diria que essa newsletter é um shot de autoamor
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Simplesmente maravilhosa!!! Gracias profundas por essa lista de auto cuidado energético! Era tudo o que eu precisava agora! Gracias! Gracias! Gracias! Amando a sendo amadora!!! Está me fazendo muito bem, e um bem muito concreto, te ler! Oba!!!! Tá me enchendo de energia e me inspirando muito! Gracias!