acho que desde o começo da minha adolescência eu sabia que não era exatamente monogâmica. me perdoe por introduzir esse assunto sem contar o que esses 16 anos de experiência me ensinaram, mas não vou. essa informação é apenas importante para a história de hoje. prometo que voltaremos a falar desse assunto (para as curiosas, hoje sou mono por opção e estou muito feliz com essa escolha. por hora).
dito isso — que meu coração não sabe amar sem ser livre — sempre que eu estive em um relacionamento, e eu adoro estar em um, houve um momento onde eu desenvolvia um crush em outra pessoa.
o padrão era o mesmo: eu não sabia (e confesso que ainda não sei) entrar em um namoro e continuar como namorada, eu sou uma esposa nata. se você namora comigo, modéstia a parte, sua vida vai dar uma guinada. você vai comer melhor, seu trabalho vai fluir, você vai ser mais consciente, você vai experimentar coisas novas e vai comer bem. mas meu amor, eu vou ser um pé no saco. eu sei ser exigente em níveis extraordinários quando amo alguém. eu faço qualquer homem pausudo se sentir just Ken1, de um jeito tão discreto que a maioria deles demora demais para perceber que eu sou a Barbie, e que nos já mudamos para a Barbieland.
como você pode imaginar, é exaustivo para ambos. mas em algum lugar eu amava isso. eu amava o desafio. eu sou a última a abandonar o barco, eu sou a que fica sem bote salva-vidas porque, adivinha! eu sei nadar — muitas histórias para outro dia.
e porque comandar um relacionamento quando o iceberg está logo ali é difícil, nessas horas eu descobria os crushes. veja, o crush não nasce PORQUE a relação fica chata ou monótona. o crush estava ali, o interesse pelo mundo dessa nova pessoa já estava plantado na boca do estômago. mas poxa vida, como eu poderia reparar nisso quando um navio inteiro depende de mim? é só quando entendo que o navio vai bater no iceberg (por mais que eu não queira admitir e que DEFINITIVAMENTE não tenha plano algum de abandonar o barco) que de alguma forma eu relaxo. é como se eu sentisse que fiz tudo o que pude e agora o destino vai tomar conta do resto.2
o último era um garçom que trabalhava comigo. recém chegado do interior, na cidade grande para ser ator, ou modelo, ou o próximo Luan Santana. 5 anos de idade mais novo que eu, e um abismo de distância em termos de experiência de vida. o que fazia ele brilhar no escuro do salão fechado no final do expediente. aquele brilho das pessoas que acabaram de quebrar a casca do ovo, mas ainda não saíram dela. ele era ingênuo e tímido, sem senso de estilo algum. ainda não sabia que era bonito, e esse era meu tipo de homem preferido, era o que eu mais amava em um homem. meu namorado da época era completamente certo da sua beleza, e com razão.
de todas as coisas que eu não sei sentir, o entusiasmo é a maior delas. o risinho com a piada fraca. buscar o nome dele na escala. dividir a tarefa de encher os saleiros no domingo, quando eu podia fazer perguntas impertinentes por que a segunda coisa que eu amo num homem é vê-lo constrangido.
e é aí, quando me vejo felizinha demais, que congelo. a catraca desce. a porta se fecha. o sorriso zipa na tentativa de guardar o frio na barriga há uma distância segura da boca, e o abdômen contrai tentando mantê-lo longe do assoalho pélvico. Ops. eu tenho um crush novo.
seguem-se semanas de fuga. a busca pelo nome na escala é para pedir uma folga. de repente não quero mais montar os saleiros, prefiro carregar as cadeiras. no final do expediente o cigarro fica para outro dia, não quero perder o ônibus.
sabe o que isso faz com um jovem homem que estava recebendo sua atenção, querida leitora? sim, você acaba de virar o objeto que brilha no escuro. agora ter a sua atenção de volta é uma questão de honra, mesmo sabendo que seu compromisso é com outro alguém.
isso já aconteceu tantas vezes, que já sei: eu fujo dessa alegria. quando estou fugindo como o diabo foge da cruz de tudo de colorido e leve e divertido e desconfortavelmente excitante que eu possa sentir, bem ali quando estou correndo a toda velocidade, quando o oxigênio já não está chegando no cérebro, sei que uma voz vai sussurrar no meu ouvido a pergunta que odeio "mas não é exatamente assim que você quer se sentir?"
quando conheci o Substack, descobri que dois criadores que amo e que são de mundos muito diferentes estavam aqui. o
com sua newsletter mensal que só consigo descrever como "bem Carvalhal" (e isso é BRANDING, senhoras) e a (hi, bestie!) semanalmente passando as referências de tudo o que havia postado nas redes sociais. ambas ideias frescas, ambas formas de construir uma relação com o público em um formato que me capturou. flertei inocentemente como flerto com tantas possibilidades. "ah, escrever emails. pode ser legal". já tinha tido uma despretensiosa experiência com isso.mas, meses depois, quando eu descobri que a
(talvez minha primeira e maior influenciadora) tinha uma comunidade/newsletter por assinatura, onde ela criava uma relação com uma audiência fiel e onde ela podia ser ela mesma e criar coisas que ela podia se orgulhar de produzir... mon. dieu.ali meu coração parou. o silêncio me envolveu como se estivesse debaixo d'água. "será?" — a palavra flutua na minha cabeça. eu sinto aquilo na boca do estômago. "ai, não, Ananda. não" a virginiana em mim, soava proibitiva. mas quando o frequencímetro voltou a apitar os batimentos falhados no meu peito, era tarde. Ops. eu tenho um crush novo.
ao contrário da minha muito trabalhada não-monogamia (eu me recuso a me identificar como "poliamor", acho a palavra cafona e automaticamente parece que eu fui fã do Teatro Mágico3. aguardo uma definição mais filosófica), minha relação com o trabalho é muito mais complexa. talvez a mais tóxica e abusiva de todas. é como se o trabalho dissesse que ninguém vai me amar preencher como ele. só minha empresa pode me trazer segurança, então é só com ela que posso gozar que devo trabalhar.
e é aqui que me pego no pulo. no passo apressado de quem vai começar a correr.
sonhar com o Sendo Amadora — estudar sobre o Substack (eu vi todas as entrevistas com o CEO e li todas as críticas à plataforma), desenhar uma estratégia, ler publicações de outras pessoas e escrever (obrigada, Deusa, pela dádiva da palavra) — é um flerte muito forte com outro tipo de vida. é quase injusto com meu trabalho como infoprodutora. eu literalmente escrevo essas newsletters em cafés charmosos, com jazz no fundo, num encontro erótico com a minha própria energia criativa. é um tesão.
por isso mesmo eu sei que nesse momento meu impulso é de fugir dessa emoção. eu percebi que me "desengajei" do projeto da newsletter, no mesmo movimento de trancar as coisas boas que sinto, antes que elas fiquem maiores que meu senso de “dever” com o meu trabalho, que depois de alguns anos de bode, tem ficado mais leve e mais divertido. não deixei de escrever nos últimos dois meses, assim como continuei minhas pesquisas e anotações. mas estendi minhas férias (de um mês, para 2 meses e meio) e não postei textos que já estavam praticamente prontos. eu me perguntei sem culpa, mas com curiosidade "do que estou com medo aqui?"
foi quando lembrei dos meus crushes. dos que eu fugi, dos que nunca iriam dar em nada, dos que poderiam ter virado muita coisa (inclusive entretenimento para o grupo do whatsapp). o medo é o mesmo: e se, no alto das minhas múltiplas paixões, eu me distrair de construir algo que é muito importante para mim?
notícia ruim para quem leu até aqui: não tenho muitas conclusões sobre como lidar com essa monogamia culposa com o trabalho e os interesses da minha alma. eu sei que não quero fazer uma "transição de carreira". eu sei que não sustento MAIS UMA relação monogâmica. é só o que sei hoje e acho que é o suficiente.
a notícia boa é que pelas próximas semanas eu enviarei edições extra (que estavam escritas, esperando para serem editadas, revisadas e ganharem imagens e estética própria — e talvez elas venham bem cruas e honestas) como forma de compensar as edições que faltaram nesse hiato não programado. não porque eu acho que elas estão em falta para você (eu acredito que, se você chegou ao ponto de financiar meu trabalho criativo, sabe que ele não é uma linha reta e em algum momento eu volto transbordando tudo o que me nutre nas minhas pausas) mas porque essas edições fizeram falta PARA MIM.
como forma de combater meu próprio medo, ao invés de fugir, resolvi investir. e deixar o caos reinar.
falando em investir
estou refazendo o planejamento estratégico dessa newsletter! nada vai mudar de substancial, algumas edições vão mudar de nome e estrutura, e quero refinar nossas conversas — por isso preciso de uma pequena ajuda sua para alinharmos expectativas.
o que você quer ler aqui? o que te interessa, inspira e vale a pena o espaço na sua caixa de entrada?
te agradeço desde já.
Recados
se você é assinante, a edição do "Sendo Organizada" chega no seu email essa semana (dição #13) com Notion, tutoriais, e updates.
se você ainda não é assinante e a sessão "Sendo Organizada" te chamou atenção, até o dia 20 de março ela estará disponível para todas as assinaturas, incluindo a mensal. depois ela será um espaço apenas para assinaturas anuais. clique aqui para entender como funciona o Sendo Amadora premium e aproveite esse momento.
do dia 25 de março ao dia 1 de maio eu darei 18 aulas sobre organização para empreendedoras e autônomas gratuitamente. clique aqui para conhecer o Desafio Autônoma & Organizada.
se eu pudesse definir o Sendo Amadora em um termo, diria que essa newsletter é um shot de autoamor
o Sendo é um lugar para te encorajar a ser mais do que o seu trabalho e suas ocupações habituais. eu te ofereço uma conversa franca sobre o que significa ser feliz enquanto mulher no mundo de hoje, e compartilho as minhas estratégias de bem viver.
criatividade | hábitos saudáveis | autoconsciência | experiências pessoais
assinando você financia a criação desse conteúdo independente, livre de anúncios, feito com amor & tempo.
o que assinantes premium recebem:
(além das newsletters públicas do Sendo Amadora, e as curtinhas do Sendo Breve que já acontecem na inscrição gratuita)
uma newsletter exclusiva a cada 15 dias com conteúdo mais íntimo, sensível e as vezes polêmico.
um guia mensal com o que estou lendo, ouvindo, consumindo, quem dei unfollow; lugares para ir em São Paulo, drinks, pratos e receitas; a marca daquele meu top de um-obro-só que vivem pedindo na DM e minhas referências (livros, cursos, coisa séria também cabe aqui).
sessões que entrarão em breve:
conforme o Sendo se torna sustentável, vou adicionando conteúdo exclusivo para assinantes (porque eles dão trabalho e precisam de cuidado, mas estou MUITO animada).
meu sistema de organização (hoje no Notion) para você copiar e colar e melhorar seu cotidiano. vou atualizar essa série a cada três meses com o que há de novo — para assinantes anuais à partir de 21 de março de 2024.
podcast semanal
encontros no zoom
encontros presenciais
exercício de escrita criativa
Nos vemos do outro lado!
uma pérola
foi uma grande identificação
nada contra. mas definitivamente não sou.
Esse papo me fez lembrar uma parte do Desce a Letra com o Pirulla e o Emílio que eles falam sobre monogamia e como ela é raríssima na natureza, e como, mesmo dentro daquele grupo de poucos animais que são monogamicos, existe a traição e promiscuidade (se é que a gente pode falar assim). Conclui, quando estava divagando sobre esse tema, que, assim como o acordo da exclusividade que nós criamos, esse peso que a gente dá para esse sentimentos e afetos naturais que nascem em nós é uma construção social para nos castrar. O que a gente pode fazer é usar-los como uma oportunidade de reavaliar, adequar, e as vezes só sentir mesmo. Falei como uma verdadeira ✨ alta presencer ✨.
Sobre o que quero ler aqui: a sua arte. Vai fundo. Estamos contigo para que você seja.
essa edição tava salva aqui há tempos e só hoje parei pra ler. e veio como uma luva no momento em que eu mais precisava ler. você escreve bem demais e me pegou logo no primeiro parágrafo. a forma livre da sua escrita faz a gente se sentir sentada num sofá completamente largada fumando um, bebendo um vinho e desabafando com uma amiga. continua, mesmo que isso te faça sentir certas travas vez ou outra. eu dei uma pausa na minha e sinto uma cócega na orelha sussurrando que deveria voltar a escrever ou a falar em podcasts. esse texto me motivou ainda mais a me ouvir.